Frases Famosas

"Existe mais filosofia em uma garrafa de vinho que em todos os livros." Louis Pasteur

sábado, 5 de agosto de 2017

VINHOS DE SUPERMERCADO Afinal, o que valem?

Por José João Santos
 

 

O que podemos esperar de vinhos de “marca branca” ou de marcas exclusivas para supermercados? Corremos sério risco de desilusão ao adquirirmos um vinho abaixo de 2€, preço muito comum em prateleira como daqui a pouco demonstramos ao leitor?

A Revista de Vinhos – A Essência do Vinho esqueceu o preconceito e tirou as medidas a 120 referências de supermercado. Houve algumas boas surpresas e vinhos que ficaram aquém dos mínimos. O exercício foi duro mas ajudou-nos a perceber que apesar de a oferta neste segmento ter aumentado exponencialmente nos últimos anos, não há milagres, antes opções a ter em conta quando procuramos bons compromissos entre qualidade e preço.


PAINEL DE PROVAS Célia Lourenço, José João Santos, Luis Costa, Manuel Moreira e Nuno Guedes Vaz Pires

Há vinhos de sonho, há vinhos memoráveis, há vinhos que consideramos serem grandes e há ainda aqueles que aconselhamos como valores seguros para um consumo quotidiano. Mas o mundo do vinho, Portugal incluído, tem muitos outros milhares de vinhos que, a crer simplesmente no preço, vários de nós desdenhariam. Ora, esse foi o primeiro dos exercícios que fizemos à partida para uma intensa manhã de provas. Mente arejada, preconceitos fora da sala, e venham de lá as amostras dos supermercados Modelo Continente, Pingo Doce, Jumbo, Lidl, Minipreço, Intermarché e El Corte Inglès. Os provadores avaliariam vinhos brancos, rosés e tintos, tendo somente conhecimento prévio da região e do ano de colheita. Nada de rótulos, esta foi uma prova às cegas.

Se a mente estava arejada e o preconceito posto de parte, partilharam-se expectativas iniciais. Se há uns dez anos a realidade destes vinhos de “marca branca” e de marcas exclusivas para supermercados se resumia a apenas alguns exemplares, hoje é distinta; há muitos vinhos, bem mais do que imagináramos. Se a quantidade aumentara exponencialmente seria de esperar que a qualidade tivesse acompanhado a evolução, mas não havia excessos de confiança neste ponto.



À partida para uma prova temática como esta devemos, antes de mais, assumir que todos nós somos consumidores e que muitas vezes adquirimos vinhos nos supermercados, baseando a escolha final, em larga medida, no preço. Se esse for o critério dominante, sublinhe-se que muitos dos vinhos provados encontram-se disponíveis a menos de 2€… garrafa, rolha e rótulo incluídos. O PVP mais baixo foi de 1,29€, com a particularidade de um dos rótulos marcado a esse preço ter sido o segundo mais bem pontuado! Na primeira posição ficou classificado o vinho com PVP também mais alto, 8,86€.

Há dezenas de exemplares com preçário inferior aos 2€, como se essa fosse uma espécie de primeira barreira psicológica de preço. Notamos uns quantos na casa dos mais de 2€ e de 3€, sendo bem mais escassos aqueles que vão além dos 4€. Como seria de esperar, o primado do preço.

Os altos e baixos da prova temática


Generalizando, a qualidade peca bastante mais nos vinhos brancos por contraponto com os tintos e os rosés cumprem o papel. Sim, nem todos os vinhos têm que ser grandiosos, bem o sabemos, mas um vinho honesto, capaz de transmitir ao que vem sem recorrer ao subterfúgio do uso e abuso de produtos enológicos para disfarçar eventuais problemas e dar um ar do que não tem, merecerá sempre o nosso respeito.

Entre as pontuações mais elevadas há somente um vinho branco. Muitos representantes da tipologia denotaram falta de equilíbrio, uns abusando dos aromas tropicais, uns quantos sem frescura, outros que tais com acidez volátil desproporcionada. Nos tintos também alguns perfis de exageros, ora de fruta ora de sensações abaunilhadas, para lembrar barrica. Há, no entanto, uma esmagadora maioria (91 vinhos) de exemplares de qualidade média, que almejaram pontuações a partir dos 13 valores. E esta última observação torna-se decisiva na relação qualidade/preço.



A classificação mais elevada desta prova foi de 16 valores, atribuída ao vinho Selecção de Enófilos Private Collection 2013, um tinto do Douro produzido pela Quinta das Bandeiras, disponível no Intermarché por um PVP de 8,86€. Meio ponto abaixo, quatro vinhos com 15,5 valores: Torre de Ferro 2014, um tinto beirão elaborado pela bairradina Adega de Cantanhede, disponível no Lidl ao preço imbatível de 1,29€; Torre de Ferro Reserva 2013, outro tinto, este do Dão, elaborado pela Global Wines, igualmente à venda no Lidl com um PVP de 2,95€; Pingo Doce Reserva Enólogo Osvaldo Amado 2014, um tinto do Dão produzido pela Global Wines para o Pingo Doce, com PVP de 2,98€; e Contemporal Selection Jaime Quendera 2012, um tinto da Península de Setúbal, elaborado pela Cooperativa Agrícola Santo Isidro de Pegões para o Modelo Continente, com PVP de 6,99€. No “ranking” segue-se uma mão cheia de vinhos pontuados com 15 valores. Depois, vários outros com 14,5, 14, 13,5 e 13 pontos.

Vinte e cinco vinhos obtiveram classificações médias entre os 11,5 e os 12,5 pontos (ver caixa). Não constam da tabela que no final deste trabalho apresentamos porque ficam abaixo dos 13 valores que consideramos como nota mínima para menção nas provas da revista. Três outros vinhos foram desclassificados. Um deles por manifesta falta de qualidade, os outros dois por apresentarem contaminação por TCA (o vulgarmente chamado “cheiro a rolha”, nas duas garrafas por cada referência que a prova disponibilizou).

Finda a contenda, várias conclusões podemos retirar. Fica desde logo claro que estes vinhos de supermercado poderão ser apostas seguras para um consumo descomprometido e diário, tornando-se por esse prisma particularmente atraentes pelo preço. Fica ainda comprovado que a qualidade média geral é aceitável, mas muito poucos são os vinhos que verdadeiramente atingem um patamar de qualidade acima dessa média. Não há milagres, apetece-nos dizer.

O desafio que lançamos ao leitor é um convite à reflexão. Valerá a pena optar exclusivamente por estes vinhos ou, com um ligeiro esforço orçamental (muitas vezes traduzido em mais alguns cêntimos ou um ou dois euros mais), será preferível atingir o patamar seguinte de qualidade e satisfação? Como sempre, uma decisão individual.

Original: http://www.revistadevinhos.pt/beber/vinhos-de-supermercado

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